Sem mais “CHAOS”, sem mais “COWS”

Henna nas mãos mais uma vez

Henna nas mãos mais uma vez

 

Ontem  à noite me despedi da Índia e depois de 8 horas já estava no aeroporto de Frankfurt. Ficarei  12 horas esperando meu vôo de conexão para São Paulo. Não tive ânimos de aproveitar o tempo para conhecer a cidade de Frankfurt. Ainda não estou preparada para encarar o mundo lá fora.

Acho que seria muito chocante passar umas horinhas rondando pelas ruas da cidade. Temo cochilar ao sentir os ares de pureza e marasmo. Não quero perder o vôo para o Brasil.

Sem opção, tomei um expresso de 4 euros (o que equivale a pelo menos 10 expressos na Índia), e decidi escrever um pouco sobre como estou me sentindo agora.

Estou com uma sensação estranha dentro de mim. Já imaginava que ir embora da Índia me deixaria com uma sensação de vazio. Me senti conectada a este país desde o primeiro dia. Os meus amigos até brincavam que eu talvez tenha sido indiana em alguma vida passada. Não duvido. Mas a verdade é que a minha adaptação aqui não poderia ter sido mais tranquila. Em nenhum dos lugares que eu morei até hoje: Inglaterra, Peru e Chile me senti assim tão em casa como na Índia. Este país me abraçou como o pai que que não teme mostrar a verdade, o pai que te faz abrir os olhos para o prazer das pequenas coisas, o pai que te deixa fazer as suas próprias escolhas, e de longe acompanha e vibra com suas conquistas. A Índia abriu meus olhos para o novo e para o diferente, e não é preciso de binóculos para enxergar tudo o que Índia tem para mostrar. É simples assim. Se você abre seu coração pra Índia, a Índia vai abrir o dela pra você. E olha que o coração da Índia é maior que coração de mãe…tem espaço para mais de 1 bilhão de pessoas.

Depois de alguns meses na Índia não sei mais o que é uma ruas sem vacas, porcos e elefantes. Não sei mais o que é não ter que andar em riquixá. Não sei mais o que é comprar sem antes barganhar. Não sei mais o que é uma viagem curta no final de semana. Não sei mais o que é comida sem curry, sem masala. Não sei mais o que é escutar música que não seja bollywood. Não sei mais o que é andar pelas ruas sem sentir uma mescla de odores distintos. Não sei mais andar na calçada. Não sei mais deixar de mexer a cabeça de um lado para o outro, dizendo tik hai, tik hai. Não sei mais viver sem o efeito surpresa diário de um país em que o impossível não é só possível mais acontece todos os dias. Enfim, vou estranhar a falta de “CHAOS e COWS” na minha vida.

A Índia causa diversos efeitos na gente. Um dos que mais me marcaram foi o fato de que o cotidiano passou a ser algo que valesse a pena ser analisado diariamente. O fato de um elefante enfiar a tromba na janela em pleno trânsito em Delhi em uma segunda-feira qualquer te coloca em uma situação cinematográfica onde as vezes você pode ser o ator principal ou apenas um mero figurante. É isso, muitas vezes achei que aquilo que estava vendo e vivendo só poderia ser coisa de cinema. O caos frenético das ruas, as pessoas com roupas que lembravam meus livros de história, os rituais e as crenças que não imaginava que existissem. Sempre pensava que logo mais o diretor do filme iria falar: “CORTA”. E aí os atores retocariam a maquiagem, trocariam o figurino e decoariam novas falas de um filme imprevisível, cheio de surpresas angustiantes, incríveis, tristes e alegres. Tudo ao mesmo tempo.

Se a Índia fosse mesmo um filme, seria de romance, suspense, terror e comédia.  Para alguns ela é só romance, pra outros só suspense, terror ou comédia. Para mim a Índia foi um pouquinho disso tudo. E sabe o que eu descobri? O filme não acaba por aí. Fez tanto sucesso que vai ter continuação. E se eu não for escalada para atriz principal, pelo menos vou chegar bem cedinho pra sentar na primeira fila do cinema. Quer vir comigo?

 

Luz, Câmera, Ação

Luz, Câmera, Ação